‘A rede de apoio contribui para que a mulher identifique a violência’
Fato & Versão
No Agosto Lilás, psicóloga comenta os tipos da violência contra a mulher, suas raízes, e a importância de buscar ajuda
“No Brasil, a violência contra a mulher é bastante naturalizada. É preciso falarmos sobre o fenômeno da violência, sobre a necessidade do apoio psicológico às vítimas, divulgarmos os canais de denúncia como o 180”. A fala é da psicóloga Amanda Abreu Silva, que comenta as raízes do problema e a importância da rede de apoio e de ações como o Agosto Lilás.
Amanda é paulistana, graduou- se na Universidade Estadual de Londrina- PR e mudou-se para Limeira recém-formada no ano de 2005, construindo aqui toda sua trajetória profissional. Atuou como psicóloga escolar, lecionou em faculdades do município e encontrou na psicologia clínica o lugar de maior identificação, realizando atendimento a adolescentes, adultos e casais. Palestrante e ativista pelos direitos das mulheres.
Como avalia a importância de um mês para a reflexão sobre a violência contra a mulher, como é o Agosto Lilás?
A campanha Agosto Lilás ainda é recente e precisa ser divulgada amplamente. Mesmo com pouco tempo de existência a campanha tem se mostrado um importante instrumento no combate a violência contra a mulher.
No Brasil a violência contra a mulher é bastante naturalizada. É preciso falarmos sobre o fenômeno da violência, sobre a necessidade do apoio psicológico às vítimas, divulgarmos os canais de denúncia como o 180 para que as mulheres saibam identificar as violências sofridas e acionar os serviços necessários.
Há meios da mulher identificar os primeiros sinais de uma violência? Quais são eles?
Quando falamos nos relacionamentos afetivos, desde o início do namoro a mulher pode ficar atenta e observar os indícios que o parceiro dá de ter comportamentos violentos. O ciúme e a tentativa de controle podem vir disfarçados de cuidado. As críticas aos comportamentos da mulher, ao tamanho da saia, a cor do batom, as críticas aos amigos e familiares. Procurar saber as histórias dos relacionamentos anteriores também pode contribuir nesse momento, saber se o homem era agressivo com a ex-mulher, como se deu o término da relação. É importante lembrar que em uma relação abusiva os comportamentos violentos tendem a serem intensificados.
Quais os tipos de violência?
A Lei Maria da Penha tipifica a violência em cinco tipos: violência física (empurrões, tapas, socos, atirar objetos, lesões com objetos cortantes ou com armas de fogo), violência psicológica (ameaças, constrangimento, humilhação, manipulação, limitação do direito de ir e vir), violência sexual (impedir métodos contraceptivos, forçar prostituição, forçar a abortar, estupro), a violência patrimonial (controlar o dinheiro, deixar de pagar a pensão alimentícia, privar de bens, causar danos a bens materiais da mulher) e violência moral (calúnias , difamação ou injúrias como expor a vida íntima, acusar a mulher de traição, fazer criticas mentirosas).
Qual a melhor hora para buscar ajuda?
Quando a mulher se encontra em um relacionamento, seja um relacionamento afetivo ou um relacionamento com um familiar e percebe uma ambivalência sobre seus sentimentos. Em alguns momentos a mulher se sente bem, feliz, amada, em outros se sente diminuída, invalidada, agredida. Nossas emoções nos dão dicas quando nossas relações não estão saudáveis. É fundamental ficarmos atentos aos sinais e procurarmos apoio psicológico.
Qual a importância de uma rede de apoio no caso da mulher que é vítima?
A rede de apoio é fundamental nesse processo. Quando a mulher sofre violência dentro da relação é comum que por conta da violência psicológica sofrida a percepção sobre si e sobre o seu relacionamento fique distorcida. A mulher nesse processo frequentemente também tem dificuldade de tomar decisões, como por exemplo fazer um boletim de ocorrência ou separar-se do parceiro. A rede de apoio contribui para que a mulher identifique a violência sofrida e auxilia a mulher a traçar uma estratégia para sair do ciclo do relacionamento abusivo.
As mulheres vítimas se culpam? Como é possível mudar isso?
Sim, a culpa é frequentemente relatada por mulheres vítimas de violência. Ela é resultado de diversos fatores como por exemplo da violência psicológica sofrida. Como a pessoa que agride é a mesma pessoa que ama, que faz carinho, divide o dia a dia, é comum a mulher ter dificuldades em se separar e esse é um outro fator que contribui para gerar culpa. O apoio psicológico é essencial para lidar com esses sentimentos.
É possível identificar porque a violência acontece? Quais fatores da sociedade ainda persistem para isso?
Acredito que ainda nos falta enquanto sociedade entendermos o quanto a base das nossas relações é bastante violenta. Somos um país muito machista e racista, esses fenômenos contribuem para que a violência contra a mulher se apresente com níveis tão alarmantes.
Como podemos mudar isso?
Precisamos de uma mudança cultural, nós, sociedade civil e poder público precisamos nos engajar amplamente para que isso aconteça. Temos que criar ações preventivas dentro das escolas discutindo machismo, racismo.
Como avalia os 17 anos da Lei Maria da Penha?
A lei mostra sua importância à medida que é executada no dia a dia contribuindo para que mulheres tenham seus direitos preservados e os homens sejam responsabilizados pelos crimes que cometeram. No entanto, sabemos que a lei é um instrumento limitado, por isso contabilizamos um número tão grande de mulheres vitimas, sendo tantas vítimas fatais.
O que não foi perguntado e que considera importante complementar?
No meu entender falta maior investimento em programas preventivos. Os movimentos conservadores crescem grandemente no Brasil e impedem que discussões essenciais aconteçam no espaço da escola. É preciso ter coragem e vontade política para mudar essa situação.
Um exemplo de uma ação importante é a presença de psicólogos e assistentes sociais devidamente capacitados presentes nos espaços das escolas para lidar com a temática da violência de forma continua e responsável.
Importante destacas que nesta semana o governo federal anunciou o Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios. O pacto contém uma série de medidas e promete ser um importante instrumento pois visa prevenir a morte violenta de mulheres.
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