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Falar sobre sexualidade ajuda a proteger crianças, analisa especialista

Novos dados da Pesquisa Nacional Educação, Valores e Direitos da mostram que 91% da população concorda que a educação sexual ajuda crianças e adolescentes a se prevenirem contra o abuso sexual. A pesquisa, coordenada pelo Cenpec e pela Ação Educativa e realizada pelo Centro de Estudos em Opinião Pública (Cesop/Unicamp) e Instituto Datafolha, entrevistou 2.090 pessoas em todo o país sobre questões consideradas polêmicas relativas à política educacional, entre elas a abordagem de questões relacionadas à educação em gênero e sexualidade. A realização da pesquisa contou com recursos do Fundo Malala. 

A questão da violência sexual e dos direitos das mulheres esteve em alta nas últimas semanas, desde que o caso da menina de 11 anos de Santa Catarina que foi vítima de estupro e teve o direito ao aborto negado veio à tona por uma reportagem do The Intercept Brasil, em 20 de junho. Infelizmente, esse não é um caso isolado: em 2021, foram registrados 45.994 casos de estupro de vulnerável no Brasil, sendo que, destes, 35.735, ou seja, 61,3%, foram cometidos contra meninas menores de 13 anos, segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2022.  

Para a professora Viviana Bastelli Paroli, a educação sexual ainda é um tabu, principalmente dentro de casa. A educadora sexual e especialista em educação destaca a importância do diálogo entre pais e filhos e ressalta: a humanidade tem que evoluir e naturalizar certos assuntos que não cabem mais ficar escondidos, pois é prejuízo na certa. 

Por que crianças e adolescentes precisam receber educação sexual dos pais/ responsáveis ou de um profissional da área? Porque como somos os primeiros professores dos nossos filhos, cabe a nós mais essa educação, como tantas outras. Talvez a que mais impacta na vida dos nossos filhos ao longo de suas existências. Se os responsáveis não oferecem, procurar um especialista no assunto pode colaborar muito nessa questão tão delicada. Por timidez, vergonha, medo e até por não terem recebido também, as famílias se fecham e isso pode prejudicar as relações. Eu recebi de maneira informal, mas ainda assim recebi. E quem não? 

Como trabalhar os assuntos sexo e sexualidade com menores de idade?

Abrindo conversas honestas e mostrando-se humano para eles. Contar sobre a sua própria infância e adolescência vai criar conexão entre pais e filhos, e consequentemente a comunicação tende a melhorar. E decidir também o que devem saber de acordo com a faixa etária em que se encontram, para fazer sentido e ter um melhor entendimento. Torço muito para que o “tio google” e a “dona internet” não substituam seres humanos nos lares brasileiros, mas não é o que percebo. 

Quais os temas mais relevantes na educação sexual hoje?

Explicar sobre violência de gênero, sexualidade positiva e vida sexual saudável. Nosso papel é deixá-los cientes e conscientes sobre esse universo tão complexo e também perigoso. Para a própria saúde mental deles, pois estão em processo de construção da autoestima e são bem vulneráveis. Como ela faz parte de duas áreas, saúde e educação, precisam saber sobre seus corpos e suas mentes. Vejo positivamente como crianças e jovens aceitam mais naturalmente os novos arranjos familiares, casais homoafetivos, etc. 

Quais os motivos que te levaram a se tornar uma educadora sexual?

Sou prova viva que leitura é fundamental e que na vida adulta faz toda a diferença. Depois da minha menarca, que é a primeira menstruação, minha mãe, sabendo que eu adorava ler, me deu uns livrinhos explicativos sobre o que uma menina-moça deveria saber. Depois por conta própria fui me informando sozinha. Como sou muito comunicativa e me expresso com facilidade, queria um nicho pedagógico para explorar, e assim me realizar como uma explicadora. Quando era jovem, já gostava de cuidar e orientar minha roda de amizades quanto a esse universo. Agora na maturidade sinto que é meu propósito de vida!

Como você enxerga a relação família e escola?

É preciso existir uma ponte entre ambas, e não um muro. Costumo dizer que assim como existem as PPP (Parcerias Público-privadas) é necessário ter outra PPP (parceria pais/professores) para o completo desenvolvimento acadêmico e humano dos educandos. Podem e devem caminhar juntos para o bem comum de todos os envolvidos. 

Quais os impactos da pandemia na saúde mental dos estudantes?

Costumo lembrar que somos seres sociais, mas nem todos nós somos sociáveis! Alguns até levaram bem, mas semelhante quer semelhante! Socialização quando se é adolescente é o que enriquece as relações. É na escola que tudo começa, lá se aprende a viver. Literalmente, a gente entende o sentido de ser! Essa revolução na educação como um todo trouxe ônus e bônus. A violência aumentou de todas as formas: física, verbal, emocional. Desequilibrou muito as pessoas, no geral. 

Por que sexo/sexualidade ainda são temas tabus?

Infelizmente, ainda é. Passamos pelo Maio Laranja (mês de combate e enfrentamento ao abuso e exploração sexual infanto/juvenil) e acabamos de sair de junho (Mês do Orgulho LGBTQIA+) e diariamente na internet e nas redes sociais ficamos sabendo de casos sérios e graves e também um aumento de denúncias de assédio moral e sexual. Além da homofobia, transfobia, racismo. Penso que depois do acontecimento de uma pandemia, a humanidade tem que evoluir e naturalizar certos assuntos que não cabem mais ficar escondidos, pois é prejuízo na certa. 

Algumas dicas e sugestões para as famílias?

Conflito de gerações sempre existiu e vai continuar existindo. Meus filhos são nativos digitais e quem os educa são pais analógicos. Particularmente, tenho dois meninos e os crio com o exemplo do pai para não serem nem machistas e nem misóginos. E hoje estou preocupadíssima com a hipersexualização das meninas, que naturalmente já sofrem somente pelo fato de serem fêmeas. O sexismo ainda existe, é perpetuado por muitos e é fomentado em várias esferas, infelizmente! 

Qual a mensagem que você gostaria de transmitir?

Que as famílias se preocupem, sim, com os chamados influenciadores digitais, que às vezes prestam um desserviço de utilidade pública. E com pessoas públicas que não tem um mínimo de senso de responsabilidade social. Não dá mais para aceitar abuso sexual infantil, adolescentes se machucando devido confusão mental quanto à sua orientação sexual e identidade de gênero, etc. Filhos são para serem aceitos e amados! Moramos no mesmo planeta terra, somos bilhões de pessoas aqui e diversidade e pluralidade fazem parte da sexualidade humana. Acolhimento e psicoterapia, quem de nós não precisa? Estamos carentes de aceitação e amor, perdendo em humanidade e civilidade. Sou esperançosa nas novas gerações, porém requer empoderamento e aconselhamento.

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