Limeirense dribla desafios de deficiência e se torna artista completa
“Procuro transformar minhas dores em arte”, diz artista
A limeirense Soraia Costa, de 40 anos, é atriz, fotógrafa, cantora, diretora de teatro e escritora. Ela sofreu um derrame, ou AVC, e acabou perdendo os movimentos da mão direita. Mas, isso não foi pretexto para deixar seus sonhos de lado. “Eu fiquei com o lado direito do corpo paralisado, precisei de cadeira de rodas, esqueci como falar, ler e escrever e tive que aprender tudo de novo. E essa condição se tornou uma Bandeira de representatividade a pessoas com deficiência. Uma das minhas militâncias é que elas possam ocupar espaço de liderança e ter o direito do seu mesmo lugar de fala, por isso que eu escrevo e dirijo porque acho que a gente também tem que ser dono das nossas narrativas”, afirma. Hoje, com apenas uma mão, Soraia fotografa e edita suas fotos.
TRAJETÓRIA ARTÍSTICA
A artista foi vencedora do Edital de Dramaturgia 2020 do Centro Cultural São Paulo, um dos mais importantes prêmios da dramaturgia, com a autoficção "Sete Cortes até você" - onde atua e também dirige - Soraia contracena com o próprio filho Valentino Manolo. "Sete cortes até você" também foi um dos projetos selecionados pelo Centro Cultural Banco do Brasil no Edital 2021/22. É uma das dramaturgas do 12° Núcleo de Dramaturgia do Sesi - SESI-British Council, onde concebeu a primeira peça da Trilogia da Abdução: Buracos Negros se alimentam de estrelas.
No cinema, atuou como Tete Barilove no filme "Mamãe tem um demônio" de Demerson Souza e foi premiada como Melhor Intérprete na Mostra de Cinema do Alto do Tietê - Curta Suzano 2020 e recebeu Menção Honrosa como Melhor Atriz no 6º Festival P.O.E de Cinema Fantástico 2020. Também gravou a trilha sonora original do filme como cantora.
Desde 2010, Soraia tem uma carreira paralela de Fotógrafa e Videomaker. Desenvolveu seu portfólio em diversos países como Itália, França, Alemanha, Inglaterra, Áustria e Brasil. Seu fashion film “Der Metropol” foi indicado como Melhor Filme no 12° Festival de Moda e Fotografia de Viena e no Berlin Fashion Film Festival (BFFF) de 2012. Este ano co-dirigiu e montou seu primeiro documentário em parceria com Maria Amélia Farah (Cia Hiato) chamado "A casa esquecida", selecionado pelo Itaú Cultural no "Múltiplos Editais de Emergência: Arte como respiro".
Dos espetáculos que participou como atriz destacam-se: Apocalipse 1.11 (Direção Antonio); Veredas da Salvação (Sandra Coverloni); Herói Devolvido (Mário Bortolotto); Curta passagem (Maurício Arruda Mendonça); Uma mulher ao Sol (resultado do seu TCC em Performance Autobiográfica em 2004 e que lhe rendeu prêmio de melhor atriz e dramaturgia no Festival Nacional de Limeira, e indicação de melhor atriz no Festival de Teatro de Ribeirão Preto).
Em paralelo a todos esses trabalhos, Soraia participou também de diversas campanhas publicitárias e editorais, inclusive com participações de artistas renomados como Duda Nagle, Carolina Ferraz e o cantor Daniel.
HISTÓRIA
Soraia conta que descobriu que queria ser atriz logo que entrou para o grupo de teatro da Escola Brasil, em Limeira. Fez alguns testes e logo ingressou na oficina de teatro oferecida pelo Estado, na Oficina Cultural Carlos Gomes. “Considero este um projeto importantíssimo para cidade. Da turma da minha época, tem muitos atores que se descobriram nessas oficinas que o Estado proporcionava. Isso foi fundamental para minha decisão e formação”, afirma. “Não posso deixar de citar também minhas participações nas oficinas da Secretaria de Cultura do município, onde fiz, por exemplo, por muitos anos, a Verônica na via”.
Depois disso, ela entrou no grupo Ágora, onde participou de diversos festivais. E, nos anos 2000, saiu de Limeira para cursar Artes Cênicas pela Universidade Estadual de Londrina (PR), além do Seminário de Max Reinhardt na Áustria - onde trabalhou, estudou por 6 anos e teve o filho Valentino, que também é ator. “O fruto não cai longe árvore, não é mesmo?”, brinca Soraia. Sua formação também se edificou em diversos workshops e cursos no Brasil e exterior. Foi na Áustria que ela se apaixonou pela fotografia. “Além do teatro e participações em filmes, eu foquei no trabalho como fotógrafa”, diz. "Em 2018, ela voltou a atuar e fez três peças com a Companhia Teatral Os Satyros, que tem tradição de 30 anos e coleciona prêmios nacionais e internacionais. “Hoje, moro alguns meses em Limeira, outros volto para em São Paulo para trabalhar e assim vou intercalando”.
Em abril, Soraia vai atuar com seu filho na peça “Sete Cortes até Você”, que foi escrita por ela. “Começaremos a ensaiar na próxima semana. Trata-se de uma peça-documentário em que eu conto a história do Valentino, que nasceu com o lábio leporino e algumas malformações congênitas”, conta.
Ela conta ainda que como artista, procura levar suas dores para as suas obras. “Sempre penso em transformar minhas dores em arte, em dissipá-las para o universo de forma que eu me cure e possa trazer uma cura para o mundo também, seja por meio do humor, da poesia, do belo enquanto estética, enquanto ideia e utopia”.
Soraia ressalta que por meio do seu trabalho procura “inspirar as pessoas a nunca desistirem dos seus sonhos, a amar sem medo, a repensar as intolerâncias e a forma com que nos relacionamos com o outro, para assim transformar a utopia de ‘mundo melhor e com mais equidade’ em ação".
Sobre as dificuldades da profissão, ela explica que “o mais difícil é ter uma primeira boa oportunidade de mostrar o seu trabalho, que é sua janela para os próximos. A minha Geração sofreu muito mais porque tínhamos que ser aceitos em agências, emissoras, sermos ‘descobertos’. Com o avanço da tecnologia, hoje é possível gravar filme no celular, ter um canal, ‘bombar’ nas redes sociais e mostrar seu talento até realmente chegar aos grandes canais e streamings. O acesso facilitou a visibilidade. Mas ao mesmo tempo a competição é maior, e é difícil se destacar com um conteúdo de qualidade em apenas 15 segundos, em tempos de superficialidade, dancinhas e padrões estéticos cada vez mais absurdos".
INSPIRAÇÕES
“Minhas inspirações vêm de muitos lugares diferentes. Na música, desde Mozart à Radiohead, de Erik Satie à Madonna, gosto do erudito e do pop e amo trilhas sonoras como de compositores como Yann Tiersen, Philip Glass e BEn Frost”. “Também sou beatlemaníaca e amo Nina Simone. No cinema, gosto da linguagem polêmica e ao mesmo tempo poética de Gaspar Noé, Nicolas Winding Refn, Lars Von Trier e do mestre Stanley Kubrick. As atrizes que são minha bussola são Marieta Severo, Andrea Beltrão e é impossivel não citar Fernandona, né? (Montenegro)”. Nas artes plásticas, Edward Hopper e na fotografia, Elizaveta Porodina e Tim Walker.
*Algumas fotos de sua autoria podem ser conferidas no site: https://soraiacostaphotography.tumblr.com
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