Contra STF, PEC que pune porte de droga é aprovada no Senado
O Senado aprovou ontem a proposta de emenda à Constituição (PEC) que criminaliza o porte de qualquer quantidade de droga, em mais uma reação protagonizada pela Casa ao Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte analisa um processo sobre o tema com entendimento contrário ao texto votado pelos senadores.
A PEC incorpora à Constituição artigo considerando tanto o posse e como o porte de drogas ato ilícito em qualquer quantidade como crime. Caberá ao policial, segundo emenda de autoria de Rogério Marinho (PL-RN), distinguir entre usuário e traficante. A Casa fez a votação em dois turnos no mesmo dia. Na primeira votação, foram 53 a favor e 9 contra; na segunda, 52 a 9. O texto, que precisava de 49 votos para ser aprovado, será analisado agora pela Câmara.
Com a diferenciação feita, a PEC abre a possibilidade de o usuário receber penas alternativas à prisão e tratamento contra dependência química. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), é autor da proposição.
Governo
Trata-se ainda de mais uma derrota que o Senado impõe ao PT, partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Isso também aconteceu, por exemplo, nos projetos de lei do marco temporal e da "saidinha", já aprovados pelo Congresso Nacional. O PT orientou voto contrário à proposta e ficou isolado. Formalmente, o governo liberou a bancada. "O governo não orienta porque é uma questão praticamente de consenso", argumentou Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo. Ele disse que votaria individualmente contra.
O PDT e o PSB, partidos mais fiéis aliados da base governista, seguiram caminho contrário e orientaram voto favorável à PEC. Acompanharam o voto favorável das siglas o PSD, o PL, o União, o PP, o Republicanos, a oposição e a minoria. O MDB e a maioria liberaram a bancada.
Consequências
Petistas dizem que haverá superlotação de prisões com o endurecimento das regras. "Transferir para terceiros, um agente público, se aquele cidadão é traficante ou dependente, é gerar um sistema que vai colocar muita gente inocente e sem necessidade na prisão", disse Rogério Carvalho (PT-SE).
Na atual legislação, o artigo 28 da Lei de Drogas diz que o usuário que portar drogas deve ser advertido, prestar serviços à comunidade ou comparecer a um programa ou curso educativo. É esse exato artigo que o Supremo avalia a constitucionalidade. Neste momento, o STF julga um caso que pode descriminalizar o uso da maconha. O placar está 5 a 3 a favor, com divergências entre os ministros sobre uma dosimetria, isto é, um cálculo de quantidade da droga que diferenciaria o usuário de um traficante
Os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, por exemplo, dizem que a quantidade limite é de 60 gramas. O crime de tráfico é passível de 5 a 15 anos de prisão, mais multa.
Oposição
A oposição capitaneia o enfrentamento ao Supremo, como aconteceu no caso da interpretação do marco temporal - que define o dia 5 de outubro de 1988 como linha de corte para a demarcação dos territórios indígenas - em lei. Os integrantes desse grupo argumentam, especialmente, que a maconha é uma "porta de entrada" para drogas mais pesadas.
"É fundamental fortalecer a legislação frente aos impasses causados por recentes interpretações judiciais", afirmou Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição no Senado, em uma das emendas que tratam do texto. "Consideramos que a decisão sobre descriminalização e fixação de limites deve ser enfrentada pelo Poder Legislativo. Essa medida legislativa reforça a prerrogativa deste Poder."
"É um momento que essa Casa toma lugar e repudia a invasão da Suprema Corte do Brasil às atribuições desta Casa", disse Magno Malta (PL-ES).
Nas Américas
O Monitor de Políticas de Drogas nas Américas, do Instituto Igarapé, aponta que quatro países nas Américas regulam a maconha para fins recreativos: Canadá, Dominica, Uruguai e Estados Unidos, onde mais de 20 Estados legalizaram esse consumo, com quantidades que variam conforme o marco regulatório local. No Uruguai, a compra de até 40 gramas por mês de maconha, em farmácias especializadas, foi legalizada em 2013.
Na Europa, Portugal é sempre citado como exemplo de uso regulamentado. No dia 1.º, ocorreu a descriminalização parcial na Alemanha.
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