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Reforma tributária: mudança vai bem além da área fiscal

A aprovação da reforma tributária brasileira sinaliza a maior transformação no sistema fiscal desde a Constituição de 1988. O novo regime de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual – com criação da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) – será implementado gradualmente de 2026 a 2033, substituindo tributos como PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. O impacto dessa mudança vai muito além da área fiscal: atinge desde a precificação de produtos até a estrutura contábil, operacional e tecnológica das empresas.



Embora o impacto da mudança seja enorme, a poucos meses da mudança muitas empresas ainda não estão preparadas. Uma pesquisa realizada pelo Thomson Reuters Institute aponta que ao menos 76% das organizações sequer iniciaram os ajustes tecnológicos e operacionais necessários, ampliando riscos financeiros e regulatórios.



O papel central da TI na reforma tributária

Entre as áreas mais afetadas pela reforma, a Tecnologia da Informação (TI) terá um papel decisivo. Com a introdução do IVA dual, os sistemas de gestão empresarial (ERPs) e softwares fiscais precisam ser profundamente adaptados para atender às novas exigências legais. Um estudo realizado pela KPMG apontou que cerca de 85% das empresas precisarão realizar adaptações importantes em seus sistemas, embora, atualmente, menos de um terço delas tenha um plano claro de ação para executar essas mudanças dentro dos prazos estabelecidos.



A responsabilidade da área de TI vai além da simples atualização tecnológica: será necessário garantir que plataformas de emissão de notas fiscais eletrônicas, soluções de gestão documental e sistemas internos de cálculo e cobrança estejam totalmente integrados às novas regras tributárias.



Além disso, novas obrigações acessórias como a Nota Fiscal eletrônica nacional unificada (NF-e), o Domicílio Tributário Eletrônico (DTE) e o mecanismo de Split Payment exigirão a integração em tempo real com sistemas governamentais via APIs. Preparar a infraestrutura tecnológica desde já será determinante para evitar prejuízos operacionais e financeiros no futuro próximo.



Fase de transição aumenta a complexidade operacional

A fase de transição da reforma tributária vai aumentar a complexidade operacional no curto e médio prazo. Entre 2026 e 2032, as empresas terão que lidar simultaneamente com dois regimes tributários, o atual e o novo, com parametrizações distintas para cada tipo de operação.



Isso significa que os processos internos – do faturamento à contabilidade – precisarão ser redobrados e cuidadosamente ajustados. Em vez de um alívio instantâneo, haverá um período de gestão dupla, exigindo controle minucioso e duplicidade de procedimentos em alguns casos. Os processos de emissão de notas fiscais, contas a pagar e a receber, apuração e escrituração fiscal, gestão de créditos tributários, serão profundamente afetadas.



As notas fiscais, por exemplo, deverão refletir os novos campos e códigos CBS/IBS, garantindo que cada nota indique corretamente o regime e alíquotas aplicáveis. Durante a transição, transações semelhantes poderão ter tratamentos tributários diferentes (parte no sistema antigo, parte no novo), exigindo que o processo de faturamento seja capaz de segregar e aplicar ambas as regras.



Os créditos e débitos de CBS e IBS vão tornar os processos de contas a pagar e a receber, apuração e escrituração fiscal mais complexos – afinal, será necessário garantir que cada operação financeira esteja corretamente registrada para que as empresas possam identificar, capturar e compensar adequadamente os créditos tributários a que têm direito. Além disso, as empresas precisarão intensificar os esforços na gestão e rastreabilidade dos créditos tributários acumulados no sistema antigo e daqueles gerados sob o novo regime, exigindo processos específicos para evitar perdas ou problemas futuros com o fisco.



Rastreabilidade e inteligência fiscal

Se antes cada imposto possuía sua própria lógica e controle separado, agora o ponto central da reforma está na rastreabilidade e consistência das informações ao longo de toda a cadeia. No modelo de IVA dual, os dados fiscais de compras e vendas de bens e serviços precisam estar integrados e coerentes, já que o crédito gerado em uma etapa será compensado nas etapas seguintes. Isso eleva a importância da governança de dados tributários dentro da empresa.



Um dos princípios do novo sistema é a não-cumulatividade plena com crédito financeiro amplo. Na prática, para usufruir dos créditos, a empresa precisará demonstrar, com documentação e escrituração precisas, a cadeia de valor de cada insumo e produto.



Informações desencontradas ou inconsistentes entre notas fiscais, registros contábeis e declarações podem resultar em perda do direito de crédito ou questionamentos do Fisco. Coerência contábil e documental deixa de ser apenas boa prática e passa a ser requisito para sustentabilidade financeira da empresa, pois impacta diretamente o montante de tributos a pagar.



Qual é a melhor estratégia para encarar a mudança?

Diante do tamanho do desafio, e pelo fato de que muitas empresas não dispõem internamente de todos os recursos ou know-how para orquestrar essa transformação de ponta a ponta, algumas organizações estão optando por consultorias de tecnologia que sejam capazes de lidar com a multidisciplinaridade que o processo exige.



Em vez de remediar problemas pontuais em cima da hora, a consultoria ajuda a antecipar ajustes – por exemplo, adequando o ERP e módulos fiscais já em 2025 para os testes de IBS/CBS, e planejando novas atualizações para cada etapa de aumento de alíquota entre 2027 e 2032. Essa visão preventiva garante que as mudanças sejam implementadas com o mínimo de disrupção.



Mais do que isso, um parceiro tecnológico com expertise pode resultar em uma economia significativa no médio prazo. O custo de corrigir uma implementação mal feita, pagar multas por descumprimento ou até paralisar operações por falha sistêmica certamente supera o investimento em um planejamento bem estruturado desde o início.



Envolver as áreas de TI, processos, dados, financeiro e compliance de forma integrada é fundamental – e o apoio de especialistas externos pode ser o catalisador que faltava para transformar uma obrigação complexa em um projeto com visão estratégica, e benefícios a longo prazo.

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